crônica de uma morte não anunciada
Então estou lá, parado no sinal de trânsito, como dezenas que estão a minha volta.
Olho pro céu, calor danado, carro sem ar condicionado é fogo mesmo, literalmente. Olho pro lado, ela, linda como sempre do meu lado, como de costume. Mando uma piscada de olhos, ela sorri meio que de deboche, só pra chatear, então dou um beijo na bochecha e ficamos rindo por algum tempo, tudo isso sem trocar nem uma palavra.
Olho novamente pro sinal, nada dele abrir.
Neste momento olho pra frente e vejo uma confusão perto da faixa de pedestres, um ladrão sai arrastando um mulher de dentro do carro a puxando pela bolsa, ela resiste ele saca um revólver e mete uns tiros para o alto. De um dos carros parados no sinal sai um homem bem forte com jeito de marombeiro e tenta segurar o bandido que começa a atirar para toda parte. Quando olho para o lado pra tentar proteger a minha namorada, tudo apaga.
Meus sonhos acabam. Meu namoro também. A faculdade nunca vai ser terminada e nem vou poder pagar a conta que deixei no café da esquina lá de casa. De uma hora pra outra meu mundo e de uma cascata de pessoas cai. Um futuro brilhante acaba de ser interrompido por uma bala perdida, bala sem rumo, bala sem sentido, bala sem porquê.
Em frações de segundos vejo muita coisa passando pela minha cabeça. Desde o batizado da minha irmã quando eu tinha 2 anos e fiquei de macacão azul numa pracinha perto da minha tia que mora em mato grosso, perguntado cadê minha irmãzinha até o ultimo sorriso que ela me deu.
Na fração de segundo que procede o tiro, levo a mão ao pescoço, meu raciocínio acelerado me avisava que seria uma morte lenta e indolor, tão grande que era o meu trauma.
Em milésimos de segundos agradeci a mim mesmo por não ter tentado a vida de funcionário público, agradeço a mim mesmo por nunca ter me envolvido com alguém por interesse, agradeço a mim mesmo por sempre ter respeitado aqueles que amo, respeitado aqueles que não amo, respeitado meus pais, meus amigos, meus professores, desconhecidos e colegas de trabalho.
Fico triste pelas fotos que não bati, as músicas que não escrevi, os discos que não ouvi e pelo livros que não li. Tudo isso em milésimos de segundos, pode acreditar.
O tempo parecia ter parado e naquele momento, com ela tentando estancar o sangramento, chorando, com uns 15 curiosos já do lado do carro, tentando apreciar um pouco de diversão gratuita e sem cortes.
E eu alí, um futuro que já não é mais nem presente. Um futuro que agora virou passado.
[qualquer erro de português, foda-se. deixa eu errar. eu quero errar.]
sábado, junho 12, 2004
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